Silvano Alves Alcantara

O presente é meu ou do Estado?

Silvano Alves Alcantara
Doutor em Direito e coordenador dos cursos de pós-graduação na Área de Direito na Uninter

Muitos são os casos em que os representantes de cargos públicos ganham presentes de terceiros. Particularmente, na seara do Poder Executivo é prática costumeira em todos os níveis, quer seja, federal, estadual e municipal.

A grande dúvida que paira é saber: de quem é o presente recebido, se da pessoa que o recebe ou se da instituição a que representa? A Lei 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, determina em um de seus incisos de seu artigo XII a proibição a todo e qualquer servidor de receber presente ou vantagem de qualquer espécie em razão de suas atribuições. Tal proibição é reiterada em outros diplomas legais, como também no Código de Conduta da Alta Administração Federal, exceto quando se tratar de autoridades estrangeiras, nos casos protocolares em que houver reciprocidade.

Fica evidente que o legislador, ao regular esta prática, estava preocupado com a lisura, com a ética e com a moral do relacionamento dos servidores públicos. Afinal, a eles é endereçado o serviço público, principalmente, para que não gerasse dúvidas quanto à transparência e ao não favorecimento do serviço prestado.

Está atualmente em debate na mídia e em outros organismos, incluindo a Polícia Federal, a situação das joias presenteadas pelo governo da Arábia Saudita ao, até então, presidente Jair Bolsonaro e à sua esposa Michele. Ora, estamos a falar de presentes recebidos pelo presidente da República durante o exercício de seu cargo. Lembrando, é claro, que ao exercer esse cargo, a pessoa que o exerce também é um servidor público. Creio que seria muito fácil responder à pergunta feita no início, sobretudo se eu fosse adepto do presidente em questão, como também se fosse contrário às suas ideias. Porém, não cabe "achismo", mas eu posso "achar" quando a própria legislação é omissa.

Nesse caso em particular, o que veio à tona foi a maneira pela qual os presentes entraram no País sem as necessárias declarações fiscais, como também sem o recolhimento tributário devido, o que pode ser configurado como crime.

Ora! Tudo estaria resolvido desde o início se as informações emitidas tivessem sido no sentido de que todos os presentes recebidos seriam incorporados ao acervo da Presidência da República, como se espera seja o ato de toda e qualquer pessoa que ocupe a cargo de maior mandatário da nação brasileira. Então, quero crer que presentes oferecidos a representantes de cargos públicos, quando recebidos, e normalmente são de valores vultuosos, devem fazer parte da instituição a que representa, podendo utilizá-lo, quando for o caso, somente durante o período em que exerça o cargo.

Portanto, caro mandatário, seja você ocupante de cargo na atualidade ou que venha a exercê-lo, o que a população brasileira espera e exige é que seus atos sejam embasados dentro dos princípios da administração pública, notadamente da legalidade e da moralidade. E que, primeiramente, não receba presentes de quem quer que seja. Mas se for de governo estrangeiro, não os leve para sua casa, pois eles não te pertencem.

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